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T O C - Transtorno Obsessivo-compulsivo

Márcio Antonio Altilio Moreira
Psicólogo - CRP 04/13451

Definição

Podemos entender o Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) como pensamentos persistentes que ocupam a mente e causam sofrimento, sendo frequente a utilização de comportamentos que conduzem a um alívio imediato, embora não duradouro, da inquietação causada pelo pensamento. No DSM-IV o TOC é classificado como Transtorno de Ansiedade e “caracterizado por obsessões (que causam acentuada ansiedade ou sofrimento) e/ou compulsões (que servem para neutralizar a ansiedade).” (p. 419). Isto é, a atividade mental é muito intensa causando pensamentos repetitivos (assustadores, sem sentido, de contaminação, de violência, de dúvidas). Tais pensamentos são de difícil controle, mesmo que sanados por alguém ou que consiga certo controle, eles teimam em voltar. Para abrandar esse sofrimento, o indivíduo recorre a um ato, uma compulsão, que lhe proporciona um alívio por um tempo. Essas compulsões se apresentam como forma de rituais (Amen, p. 168)


Para se caracterizar como transtorno “as obsessões ou compulsões devem causar acentuado sofrimento, consumir tempo (mais de 1 hora por dia) ou interferir significativamente na rotina normal, no funcionamento ocupacional, em atividades sociais habituais ou relacionamentos dos indivíduos”. (DSM-VI, p. 444).

Obsessões

“As obsessões são ideias, pensamentos, impulsos ou imagens persistentes, que são vivenciados como intrusivos e inadequados e causam acentuada ansiedade ou sofrimento”. (DSM-IV, p. 443). Podem ser de diversas formas, tais como “pensamentos recorrentes, maníacos ou assustadores” (Amen, p. 168), dúvidas ou preocupações excessivas acerca de situações que fogem a normalidade. Esses pensamentos causam muita ansiedade e/ou desconforto e/ou medo. Quanto mais se tenta controlá-los, mais intensos ficam. O indivíduo é capaz de reconhecer que esses pensamentos são produtos de sua própria mente, mas são incapazes de se libertar deles.


As obsessões mais comuns envolvem os seguintes temas (http://www.ufrgs.br/toc/):

  • Sujeira, contaminação;

  • Dúvidas;

  • Simetria, perfeição, exatidão ou alinhamento;

  • Impulsos ou pensamentos de ferir, insultar ou agredir outras pessoas;

  • Sexo ou obscenidades;

  • Armazenar, poupar, guardar coisas inúteis ou economizar;

  • Preocupações com doenças ou com o corpo;

  • Religião (pecado, culpa, escrúpulos, sacrilégios ou blasfêmias);

  • Pensamento mágico (números especiais, cores, datas e horários).

 

Alguns exemplos: Pensamentos de que necessitam limpar a casa constantemente até não encontrar nenhuma sujeira; medo de ser contaminado por algum germe ao tocar em maçanetas, cumprimentar com aperto de mão, de passar perto de excrementos de animais ou humanos etc.; dúvidas quanto a não ter trancado portas e/ou janelas, de ter feito mal a alguém etc.; pensamentos que se não fizer o mesmo caminho pode acontecer algo ruim; dificuldade em descartar objetos inservíveis com receio de que irá precisar deles algum dia; etc.


Importante salientar que essas obsessões não sejam preocupações exageradas com o mundo real, tais como: dificuldades financeiras, possibilidade iminente de perda de emprego, uma doença real em si mesmo ou em alguém da família etc.

Compulsões e rituais

“São comportamentos repetitivos (p.ex., lavar as mãos, ordenar, verificar) ou atos mentais (p.ex., orar, contar, repetir palavras em silêncio) com o objetivo de prevenir ou reduzir a ansiedade ou sofrimento, em vez de oferecer prazer ou gratificação”. (DSM-IV, p. 443-4) Essas atitudes decorrem em função do pensamento obsessivo e visam reduzir a tensão produzida por esses pensamentos. Na maioria das vezes os rituais não representam solução lógica para o problema que causa preocupação, ou seja, não servem para resolver o problema, mas causam alívio quando realizados. Por exemplo, para evitar algum desastre o indivíduo pode bater três vezes na madeira. Nem sempre esses rituais podem ser presenciados pelos que convivem com os portadores do TOC, pois podem ser atitudes mentais, como contar ou rezar rapidamente em silêncio

 
As compulsões mais comuns envolvem os seguintes temas (http://www.ufrgs.br/toc/):

  • De lavagem ou limpeza;

  • Verificações ou controle;

  • Repetições ou confirmações;

  • Contagens;

  • Ordem, arranjo, simetria, sequência ou alinhamento;

  • Acumular, guardar ou colecionar coisas inúteis;

  • Compulsões mentais: rezar, repetir palavras, frases, números;

  • Diversas: tocar, olhar, bater de leve, confessar.

 

Alguns exemplos: necessidade de lavar as mãos por muito tempo (às vezes por uma hora) para aliviar o medo de contaminação; repetir sempre o mesmo caminho com medo de ocorrer algum desastre; sentir-se obrigado a contar os degraus das escadas; verificar várias vezes portas, janelas, torneiras etc.; acumular garrafas, jornais, objetos inservíveis ou colecionar objetos inúteis.


Também é comum a evitação de certas situações, como: usar banheiro público, sentar em bancos de uso comum etc.; tocar em maçanetas, corrimões, ou qualquer objeto que possa estar contaminado; evitar sair em determinado horário ou dia da semana etc.

 

Transtornos relacionados ao TOC

 

“Existem outros transtornos que podem ser associados ao TOC, pois pessoas com esses distúrbios ficam presas em pensamentos indesejáveis e repetitivos e não conseguem tirá-los da cabeça, a menos que ajam de uma maneira específica” (AMEN, p. 169). De acordo com o psiquiatra Ronald Pies (citado por AMEN), o espectro postulado do TOC inclui: arrancar cabelo (Tricotilomania), roer as unhas, síndrome de Tourrette, cleptomania, doença corporal dismórfica (sentir que uma parte do corpo é excessivamente feia), hipocondria, autismo, compras compulsivas, jogar de forma patológica, dor crônica, doenças viciosas e distúrbios alimentares. Podemos incluir ainda o colecionismo e, segundo AMEN (p. 169) o Distúrbio do Desafio de Oposição. A seguir, veremos um pouco sobre algumas delas:

1- Colecionismo


Devido à particularidade da questão, consideremos como colecionismo as situações em que os portadores sentem-se compelidos a acumular grande quantidade de objetos inservíveis de tal modo a prejudicar a higiene da moradia que ocupa. São situações extremas, sendo que em algumas vezes pode-se acumular animais sem ter condições de cuidar deles. O apego desenvolvido parece as impedir de descartar qualquer coisa, por mais absurda que seja. Na maioria das vezes a situação se torna insustentável para o convívio com outras pessoas e acabam tendo que viver sozinhas. Os objetos podem ser comprados ou coletados dos lixos dos vizinhos.


Ainda não está claro se o colecionismo é um transtorno isolado ou faz parte do Transtorno Obsessivo-compulsivo. Ao que parece o guardar está relacionado com a dificuldade em tomar decisões corretas frente às situações, não à necessidade em si de ajuntar.

 

Ou seja, o indivíduo não confia no seu próprio julgamento para descartar objetos que, segundo pensa, poderia vir a precisar.

2- Tricotilomania


De acordo com o DSM-IV, “a característica essencial da Tricotilomania consiste em arrancar os próprios cabelos de maneira recorrente, resultando em perda capilar perceptível. Os locais de onde os cabelos são arrancados podem compreender qualquer região do corpo (inclusive as regiões axilar, púbica e perirretal), sendo os pontos mais comuns o couro cabeludo, sobrancelhas e cílios” (DSM-IV, p. 633).


O ato repetitivo de arrancar os cabelos na Tricotilomania deve ser diferenciado de uma compulsão, como no Transtorno Obsessivo-Compulsivo.

3- Transtorno de Tourette


O transtorno parece ter causas genéticas e de acordo com o DSM-IV, as características essenciais são múltiplos tiques motores e um ou mais tiques vocais, sendo que podem aparecer simultaneamente ou em diferentes períodos, durante a doença. Os tiques ocorrem muitas vezes ao dia, de forma recorrente.


Esses tiques normalmente envolvem a cabeça e outras partes do corpo, como o tronco e pernas. Os tiques vocais incluem palavras ou sons como estalos, grunhidos, fungadas, espirros e tosse. Em alguns casos essa verbalização consiste em dizer palavras obscenas (indecentes, imorais).


O transtorno geralmente inicia-se na infância ou início da adolescência. Em média tem início entre os 6 a 7 anos. A duração do transtorno, na maioria das vezes, é vitalícia, embora possam ocorrer momentos em que os sintomas não estejam presentes durando semanas a anos (DSM-IV, p. 137).

4- Hipocondria


É um transtorno em que o paciente se preocupa com a crença de ser portador de alguma doença séria baseado em interpretações errôneas de sinais ou sensações físicas, embora não sejam encontradas causas médicas para isso. O portador do transtorno fica atormentado pelo medo de estar doente, não obstante as declarações dos médicos de que se encontra saudável.


Embora classificada como Transtorno Somatoforme (sintoma físico sem constatação de doença) pelo DSM-IV, essa obsessão se assemelha ao TOC, inclusive pela necessidade (compulsão) de procurar diversos médicos, realizar diversos exames e sentir necessidade em tomar medicações.

Causas neurobiológicas

De acordo com Amen (p. 169) “uma pesquisa muito interessante feita nos últimos anos mostrou um padrão biológico associado ao TOC. Estudos do cérebro por SPECT (tomografia computadorizada por emissão de fóton único) mostraram um aumento do fluxo sanguíneo no sistema cíngulo, junto com um aumento da atividade dos gânglios basais (frequentemente o componente de ansiedade do problema)”.


O TOC é também quatro vezes mais frequente em famílias em que já exista um portador, sugerindo a existência de um componente genético.


Em razão de o TOC poder ser amenizado e até tratado com medicações que estimulam a função serotonérgica sugere que deva existir um distúrbio neuroquímico no cérebro dos portadores do transtorno.


O TOC também pode ocorrer após traumatismos, lesões ou infecções cerebrais.

Causas psicológicas

Apesar de poder haver componentes neurológicos, genéticos ou mesmo algum traumatismo, lesão ou infecção cerebral, os fatores psicológicos podem amenizar ou agravar os problemas. Tem-se observado o surgimento (manifestação) do TOC após traumas ou estresses psicológicos, o que aponta também para a sua natureza psicológica.


Outra questão, é que o paciente aprende a lidar com os pensamentos obsessivos através de compulsões, que amenizam seu trágico efeito e acabam obtendo alívio através deles, fortalecendo seu uso. Desse modo, a maneira de pensar e agir torna-se um ciclo vicioso que dificulta seu controle e eliminação. Os pensamentos são ajustados de modo a proporcionar alívio, embora sejam desajustados socialmente, de durações limitadas e ineficientes na cura do transtorno.


Outro fator que pode agravar a problemática está ligado ao tipo de criação, com pais muito rígidos e exigentes que podem causar culpa extrema ainda em idade precoce. Também a religião e/ou cultura pode influir no modo como o indivíduo lida com as situações do dia a dia. Esses fatores podem contribuir no surgimento de crenças negativas extremamente fortes, que estão com frequência presentes no pensamento do portador do transtorno e impedem dele fluir na vida com naturalidade. Na maioria das situações a autoestima do portador é muito baixa, não confiando em seus próprios julgamentos e nem mesmo nas evidências apresentadas.

 

Tratamento

O tratamento, na maioria das vezes, consiste em uso de fármacos (medicamentos) e psicoterapia. A medicação atua na química cerebral e a psicoterapia na correção dos vícios psicológicos e esclarecimento sobre a realidade das compulsões e apresentação de alternativas mais eficazes. Veremos a seguir os recursos farmacológicos e psicoterápicos disponíveis. 

1- Farmacológico


O uso de fármacos auxilia no controle dos pensamentos indesejáveis e na necessidade dos rituais e compulsões destinados a aliviá-los. São utilizados para o tratamento os medicamentos antidepressivos que possuem ação antiobsessiva. A dose utilizada é normalmente mais elevada que para a depressão. Os médicos costumam começar com uma dosagem média e acompanhar a evolução, podendo, caso não apresente os resultados esperados, passar para a dosagem máxima ou utilizar outro medicamento. Isso acontece porque o paciente pode não responder satisfatoriamente a uma droga e responder bem a outra.


É necessário paciência para aguardar os resultados, pois pode demorar até doze semanas para que a ação comece a apresentar os efeitos desejados. De modo algum o paciente deve interromper seu uso sem consentimento do médico. O desaparecimento dos sintomas também é gradual, ou seja, a redução das obsessões vai diminuindo aos poucos e pode mesmo não ser completa. Daí a necessidade de um acompanhamento psicológico.


É muito importante manter o tratamento, pois pode haver recaída. A retirada da medicação pode ocorrer após um ano em que não apresente os sintomas, a critério médico. Embora esses medicamentos não viciem, sua retirada deve ser gradual para evitar desconforto.

2- Psicoterápico
A recomendação médica usual é pelo tratamento através da Terapia Cognitivo-comportamental - TCC , no entanto, a psicologia dispõe de um arsenal bem maior. Assim sendo, iremos trabalhar com todas as possibilidades que temos a nosso dispor, aumentando as chances de remissão do transtorno. Como vimos anteriormente, a aprendizagem de recursos precários para o alívio dos sintomas, feitos através das compulsões, é uma constante e necessita efetuar mudança para uma direção mais saudável. Outra questão diz respeito ao enfrentamento dos pensamentos obsessivos que, frequentemente, não condizem com a realidade, mas que o indivíduo demonstra muita dificuldade em deixar de acreditar neles. Por exemplo, ter medo de ser contagiado por coliformes fecais (bactérias presentes nas fezes de humanos e animais) apenas por passar próximo a excrementos. Embora isso não aconteça, o paciente não consegue se convencer disso e alimenta a necessidade de lavar as partes do corpo, que acredita terem sido contaminadas, por tempo excessivo. Para se lidar com isso é necessário promover a mudança racional, fornecendo elementos que possam fortalecê-lo cognitivamente (instruí-lo quanto à realidade). Para isso aTerapia Cognitivo-comportamental - TCC e a Abordagem Ericksoniana, aliada ou não a hipnose, tem demonstrado ser muito eficaz.


Como vimos, o TOC pode surgir de traumas psicológicos e, para isso, a utilização do EMDR promove a despotencialização, ou seja, faz com que as lembranças se tornem mais suaves e não tragam mais nenhum desconforto emocional. Assim, os pensamentos obsessivos que ficavam ruminando internamente deixam de existir e a necessidade dos rituais e compulsões perdem o sentido e se esvaem (desaparecem). Com essa mesma finalidade se pode utilizar o Brainspotting. As duas abordagens são muito eficientes no processo de reorganização das atividades psíquicas.


Para a eliminação das crenças negativas associadas ao modo como vivenciam alguns aspectos culturais, religiosos, de criação ou aprendidos e que sejam inadequados podem ser trabalhados por qualquer uma das abordagens com resultados muito satisfatórios.


A duração do tratamento varia de caso para caso, enquanto alguns, mais elementares, podem levar poucas sessões, outros, mais severos, podem demorar vários meses. Os casos mais simples, muitas vezes, podem ser tratados apenas com psicoterapia, mas os complexos necessitam de auxilio medicamentoso, pois o sofrimento se torna muito intenso e dificulta o processo psicoterápico.

Bibliografia

  1. AMEN, Daniel G. Transforme seu cérebro, transforme sua vida: um programa revolucionário para vencer a ansiedade, a depressão, a obsessividade, a raiva e a impulsividade. São Paulo: Mercuryo, 2000.

  2. ARASI, Diana et al. Trauma e EMDR – Uma nova abordagem terapêutica. Brasília: Nova Temática, 2007.

  3. DSM-IVTM – Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. trad. Cláudia Donelles; – 4ª ed. rev. Porto Alegre: Artmed, 2002.

  4. GRAND, David. Cura emocional em velocidade máxima – o poder do EMDR (dessensibilização e reprocessamento através dos movimentos oculares). Brasília: Editora Nova Temática. 2007.

  5. http://www.ufrgs.br/toc/, disponível em 16 de fevereiro de 2013.

  6. LEVINE, Peter A. O Despertar do Tigre – curando o trauma. São Paulo: Summus, 1999.

  7. RANGÉ, Bernard. Psicoterapias Cognitivo-Comportamentais. Porto Alegre: Artmed, 2001

  8. ROBLES, Teresa. Concerto para quatro cérebros em psicoterapia. Tradução de Manuel Angel Valencia Rodrigues. Belo Horizonte: Editorial Diamante, 2001.

  9. ROSSI, Ernest Lawrence Ph.D. A Psicobiologia da cura mente-corpo. Tradução de Ana Rita P. de Moraes. Campinas: Editorial Psy, 1997.

  10. SHAPIRO, Francine. EMDR – Dessensibilização e reprocessamento através dos movimentos oculares. Brasília: Editora Nova Temática, 2007.

  11. TenDan, Hans. Cura Profunda. São Paulo: Summus, 1997.

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